quarta-feira, 16 de maio de 2012

O SISTEMA DE DÍZIMO CONFORME O ENSINO BÍBLICO


INTRODUÇÃO


I - O DÍZIMO NO ANTIGO TESTAMENTO

    a)      Na Era Patriarcal
            A prática de devolução do dízimo não tem origem humana, mas foi ordenada pelo próprio Deus ao Seu povo. Ela faz parte do concerto salvífico, por isso, apenas aqueles que estão obrigados pelo pacto ou aliança com Deus devem dizimar, ainda que Deus o receba de quem O quiser devolver. Esse fato fica bem claro ao se considerar a primeira menção da prática na Bíblia, no encontro de Abrão com Melquisedeque, “rei de Salém” e “sacerdote do Deus Altíssimo” (Gn 14:17-20).
A devolução foi feita à pessoa certa, um sacerdote do Deus Altíssimo, no momento em que este foi assim reconhecido, como uma forma de tributar a Deus os méritos pela vitória (v. 20) e também por ser “Deus Altíssimo, o que possui os céus e a terra” (v. 22). Jacó, neto de Abrão, também devolveu o dízimo como reconhecimento de que tudo que possuía havia sido outorgado por Deus (Gn 28:22).

    b)     Depois da Organização Política de Israel
Depois da saída do Egito e da organização do povo de Israel, a tribo de Levi foi encarregada de prestar serviços relacionados à tenda da congregação (Nm 18:21). As demais tribos poderiam se engajar em qualquer atividade lícita, como criar gado ou plantar, mas a tribo de Levi cuidaria dos “negócios” divinos. O sistema de dízimos foi a forma estabelecida por Deus para o sustento dessa tribo que deveria se dedicar integralmente às atividades litúrgicas (Nm 18:20-24).
Muito depois da era mosaica, no tempo de Malaquias (fins do século VI e início do século V a. C.), o dízimo continuava sendo usado para a manutenção da “casa do Tesouro” (Ml 3:10). Portanto, com o mesmo objetivo da época em que foi instituído o sistema levítico.
            Dessa forma, em relação ao Antigo Testamento, não há o que discutir. O dízimo foi estabelecido como parte do pacto entre Deus e o Seu povo escolhido. A prática é encontrada ao longo de todo o período da velha dispensação.

Como Deus Encara o Sistema do Dízimo

O ato de dizimar é baseado num princípio fundamental, como expresso pelo salmista, “ao SENHOR pertence a terra e tudo o que nela se contém, o mundo e os que nele habitam.  Fundou-a ele sobre os mares e sobre as correntes a estabeleceu” (Sl 24:1-2). Quando Deus colocou o homem no jardim do Éden, permitiu que ele comesse de qualquer fruto, mas, vetou o fruto de uma das árvores. Daquela, o homem não poderia lançar mão (Gn 2:15-17). Ao olharmos o pano de fundo dessa ordem, percebemos o princípio do sistema de dízimos. O Senhor nos permite lançarmos mão de nove décimos, mas, um décimo Lhe pertence!
Foi por isso que ordenou ao seu povo no passado, “também todas as dízimas da terra, tanto dos cereais do campo como dos frutos das árvores, são do SENHOR; santas são ao SENHOR. Se alguém, das suas dízimas, quiser resgatar alguma coisa, acrescentará a sua quinta parte sobre ela. No tocante às dízimas do gado e do rebanho, de tudo o que passar debaixo do bordão do pastor, o dízimo será santo ao SENHOR (Lv 27:30-33).
Enquanto as ofertas estão relacionadas ao sacrifício de Jesus, pois, o sistema de ofertas só entrou em operação depois do pecado: “Fez o SENHOR Deus vestimenta de peles para Adão e sua mulher e os vestiu” (Gn 3:21). A morte daquele primeiro cordeiro foi uma provisão divina para que Adão e sua mulher não pagassem a pena pela transgressão exigida pela lei (Rm 6:23; Ap 13:8). Aquele cordeiro foi uma figura ou sombra tipológica do “Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo” (Jo 1:29).
Portanto, ao dizimarmos, reconhecemos a soberania divina. Ele é o nosso Criador, por isso, devemos horná-Lo. Mas, quando damos as nossas ofertas, estamos ao mesmo tempo, agradecendo a maravilhosa provisão divina em nosso favor, Jesus Cristo, que rendeu a Sua preciosa vida por nós, a fim de não perecermos eternamente (Jo 3:16).

II - O DÍZIMO NO NOVO TESTAMENTO

O Novo Testamento não aboliu o sistema de dízimos. Quando Jesus fundou a Igreja, também transferiu as prerrogativas do antigo povo eleito para o povo da nova aliança. O Senhor sempre teve um remanescente, depositário da Sua aliança e fiel ao Seu concerto, como pondera LaRondelle:

Paulo continua a teologia de Hebreus de que "o remanescente é que será salvo" (Rom. 9:27; citando Isa. 10:22-23 onde o remanescente de Israel retorna "ao Deus forte", verso 21). A mensagem de Paulo consiste em que Deus é fiel à Sua palavra porque mais uma vez proveu graciosamente de Israel um remanescente de fé, a igreja apostólica, através do poder criador de Sua promessa. "Assim, pois, também agora, no tempo de hoje, sobrevive um remanescente segundo a eleição da graça" (Romanos 11:5). Os herdeiros legítimos do concerto mosaico e abraâmico não são os descendentes descrentes e naturais de Abraão ("Israel segundo a carne", 1 Coríntios 10:18), mas exclusivamente os seus filhos espirituais, aqueles que pertencem a Cristo [Hans k. LaRondelle, O Israel de Deus na profecia: princípios de interpretação profética, trad. Josimir Albino do Nascimento (Engenheiro Coelho, SP: Imprensa Universitária Adventista, 2002), 150.].

Paulo defende a aplicação do sistema de dízimos para a manutenção daqueles que se dedicam integralmente à pregação do evangelho (1Co 9:6-14), embora tenha aberto mão desse direito (1Co 9:12, 15), pelo menos sobre a igreja de Corinto (2Co 11:7). Conforme argumenta Elmir Santos, “por causa da contestação do seu apostolado (2Co 11:5, 6) e para não dar ocasião aos falsos apóstolos (2Co 11:8 a 13), no entanto, usou desse direito aceitando salário de outras igrejas (2Co 11:8)” [Elmir P. Santos, Segundo dízimo: ampliando a visão sobre a oferta (Juiz de Fora, MG: Gráfica e Editora Juizforana, 2009), 20.]
O apóstolo defende a manutenção do ministério com base numa injunção do Antigo Testamento, na sua carta a Timóteo (1Tm 5:17-18), para que o ministro não precise se envolver em “negócios desta vida” (2Tm 2:4). Ou seja, de acordo com o Novo Testamento, o pastor deve se dedicar exclusivamente ao evangelho, nos moldes da antiga tribo de Levi, cuja atividade se concentrava em cuidar dos interesses de Deus “pastoreando” o Seu povo, enquanto, esse mesmo povo, lhe garantia o sustento material. Contudo, o exercício das atividades ministeriais deve ser efetuado “espontaneamente, como Deus quer; nem por sórdida ganância, mas de boa vontade” (1Pe 5:2).


III - JESUS E O DÍZIMO

            O Senhor Jesus afirmou em Mateus 5:17-20, “Não penseis que vim revogar a Lei ou os Profetas; não vim para revogar, vim para cumprir. Porque em verdade vos digo: até que o céu e a terra passem, nem um i ou um til jamais passará da Lei, até que tudo se cumpra. Aquele, pois, que violar um destes mandamentos, posto que dos menores, e assim ensinar aos homens, será considerado mínimo no reino dos céus; aquele, porém, que os observar e ensinar, esse será considerado grande no reino dos céus. Porque vos digo que, se a vossa justiça não exceder em muito a dos escribas e fariseus, jamais entrareis no reino dos céus.”
Em relação ao sistema de dízimos, Ele deixou claro no Seu diálogo com os líderes religiosos: “Ai de vós, escribas e fariseus, hipócritas, porque dais o dízimo da hortelã, do endro e do cominho e tendes negligenciado os preceitos mais importantes da Lei: a justiça, a misericórdia e a fé; devíeis, porém, fazer estas coisas, sem omitir aquelas!” (Mt 23:23 – grifo nosso).
Jesus era um Mestre ou Rabi, e como de costume, sustentado pelos seus discípulos. Esse fato é facilmente observado ao lermos Lucas 8:1-3, “Aconteceu, depois disto, que andava Jesus de cidade em cidade e de aldeia em aldeia, pregando e anunciando o evangelho do reino de Deus, e os doze iam com ele, e também algumas mulheres que haviam sido curadas de espíritos malignos e de enfermidades: Maria, chamada Madalena, da qual saíram sete demônios; e Joana, mulher de Cuza, procurador de Herodes, Suzana e muitas outras, as quais lhe prestavam assistência com os seus bens” (grifo nosso).

IV – COMENTÁRIOS DE ELLEN G. WHITE SOBRE O DÍZIMO

    a)      Sua irrevogabilidade
Usa-se a mesma linguagem quanto ao sábado que se usa na lei do dízimo: "O sétimo dia é o sábado do Senhor, teu Deus." Êxo. 20:10. Não tem o homem o direito nem poder para substituir o sétimo dia pelo primeiro. Poderá pretender fazê-lo, "todavia, o fundamento de Deus fica firme" II Tim. 2:19.
Os costumes e ensinos dos homens não diminuirão as exigências da lei divina. Deus santificou o sétimo dia. Essa porção específica de tempo, separada pelo próprio Deus para culto religioso, continua hoje tão sagrada como quando pela primeira vez foi santificada pelo nosso Criador.
De igual maneira, o dízimo de nossas rendas "santo é ao Senhor". O Novo Testamento não dá novamente a lei do dízimo, como também não dá a do sábado; pois pressupõe a validade de ambos, e explica sua profunda importância espiritual. ...
Enquanto nós como um povo estamos procurando dar fielmente a Deus o tempo que Ele conservou como Seu, não Lhe daremos também nós aquela parte de nossos meios que Ele exige? [Ellen G. White, Conselho Sobre Mordomia (Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, s.d.), 66, 1CD-Rom].

    b)     Sua Finalidade
De acordo com Ellen G. White, os propósitos do sistema do dízimo compreendem:
   1.      O “bem do homem” [Ellen G. White, Conselho sobre mordomia, 180]
   2.      Para despojar do egoísmo [Ibid., 24-26]
   3.      Desenvolver o espírito de gratidão [Idem, Nos lugares celestiais, MM 1968, 24 de outubro, 304.]
   4.      Porque Deus “reservou-o para Si, para ser empregado em fins religiosos” [Idem, Conselho sobre    mordomia, 6]
   5.      É uma questão de honestidade [Idem, Educação, 139]
   6.      Uma forma de reconhecer a Deus como “Doador de todas as coisas” [Idem, A fé pela qual eu vivo, MM 1959, 26 de agosto, 244.]
   7.      “para levar avante a obra do evangelho” [Ibid.].

    c)      Advertência aos Pastores
Nomeie a igreja pastores ou anciãos que sejam dedicados ao Senhor Jesus, e cuidem esses homens de que se escolham oficiais que se encarreguem fielmente do trabalho de recolher o dízimo. Se os pastores não se demonstrarem aptos para o cargo, se deixarem de apresentar à igreja a importância de devolver ao Senhor o que Lhe pertence, se não cuidarem de que os oficiais que estão sob suas ordens sejam fiéis, e que o dízimo seja trazido, estão em perigo. Estão negligenciando uma questão que envolve uma bênção ou maldição para a igreja. Devem ser afastados de sua responsabilidade, e outros homens devem ser experimentados e provados.
Devem os mensageiros do Senhor cuidar de que os membros da igreja Lhe cumpram fielmente as ordens. Deus diz que deve haver mantimento em Sua casa, e se se lidar indevidamente com o dinheiro do tesouro, se se considerar direito as pessoas usarem o dízimo como quiserem, o Senhor não poderá abençoar. Ele não pode suster os que pensam poder fazer o que querem com o que Lhe pertence (Ellen G. White, Conselho Sobre Mordomia, 106).
Sobre o caráter da benevolência sistemática, Ellen G. White faz um comentário auspicioso ao dizer: “é belo em sua simplicidade e equidade. Todos podem dele lançar mão com fé e ânimo, pois é divino em sua origem. Nele se aliam a simplicidade e a utilidade, e não exige profundidade de saber o compreendê-lo e executá-lo” [Ibid.].


CONCLUSÃO

            O dízimo não é para ser devolvido por aqueles que estão fora da aliança, a não ser que queiram. Deus exige a prática apenas do Seu povo escolhido, os que fizeram um pacto de amor com Ele. Assim como era exigido do povo de Israel o sustento da tribo de Levi, tendo em vista que esta deveria cuidar da liturgia e dos negócios divinos para que todo o povo de Deus fosse assistido, assim também, os “que pregam o evangelho que vivam do evangelho” (1Co 9:14). Mesmo Jesus viveu da provisão continuada no Novo Testamento (Lc 8:1-3), e depois Dele, os apóstolos, como exemplificação e paradigma para toda a dispensação neotestamentária.
            No entanto, aqueles que vivem do evangelho devem ser homens consagrados, dedicados e honestos, não movidos por “sórdida ganância, mas de boa vontade” (1Pe 5:2). O sistema foi estabelecido para o bem do homem, a fim de desenvolver o espírito de gratidão e louvor, para que Deus seja reconhecido como soberano, para provar a honestidade do crente e despojá-lo do egoísmo.
Enquanto a devolução do dízimo é um ato que expressa gratidão pela Criação divina, a oferta é um ato de reconhecimento pelo que Cristo fez na cruz do Calvário, doando-Se inteiramente a favor do ser humano, a fim de lhe outorgar a salvação e ainda prover um exemplo magnânimo de abnegação.
Os pastores e anciãos que são leais ao seu mandado devem instruir a igreja quanto à devolução daquilo que pertence ao Senhor, do contrário, estarão negligenciando um dever da maior importância. Dessa forma, também provando estar desqualificados para a função.
            O sistema é simples e belo, e todo o que liberalmente devolve o dízimo cresce como cristão e como pessoa humana, pois, ele humaniza, desenvolve a abnegação, despoja o homem de si mesmo e faz pensar em Deus e na Sua grande obra de evangelizar o mundo.


Pr. Josimir Albino do Nascimento, Doutor em Teologia Pastoral